Friday, February 20, 2009

Gutto

De Corpo e Alma na música, Augusto Armada, 36 anos, licenciado em direito, mas é como Gutto que o público melhor o conhece. Desde os Black Company às inesquecíveis parcerias com o amigo e sócio Boss AC, passando pelos álbuns da carreira a solo e o regresso dos Black Company, Gutto tem uma história que merece ser contada…

Qual o estado actual da música em Portugal?
Há música boa e música má. Em Portugal sempre se fez música com qualidade, assim com sempre houve artistas menos bons.

E o teu trabalho, em qual dessas duas vertentes se integra?
Não me cabe a mim avaliar isso. Faço a minha música, que é aquilo que me dá prazer, e o resto vem naturalmente… mas dentro da minha área, quer no hip-hop ou no R&B, faço o melhor que posso e sei.

Há quem diga que vives na sombra do Boss AC…
(Risos) Acho que já tenho currículo e trabalhos suficientes para não viver na sombra de ninguém. Eu e o AC sempre fomos parceiros. Felizmente, entendemo-nos muito bem a trabalhar em conjunto e as nossas parcerias têm resultados espectaculares. Temos sempre muito gosto em trabalhar um com o outro, até porque eu sou fã dele e acho, até certo ponto, que ele também é meu fã. Mas não posso negar que as pessoas pensem isso, até porque ele teve um sucesso estrondoso e quando isso acontece as pessoas têm tendência de dizer isso. Mas se retirares o sucesso comercial, ou de vendas e discos de platina, sombram dois músicos que gostam de fazer música, gostam de fazer o seu trabalho, e gostam de trabalhar em conjunto. Mas eu tenho o meu estilo e ele tem um estilo completamente diferente. As duas coisas não se misturam minimamente.

Dez anos depois do último disco, os Black Company, pioneiros do hip-hop em Portugal, estão de volta. Como e porquê este regresso?
Eu tive oportunidade de experimentar o R&B nos três álbuns a solo que fiz. Entretanto, claro, o bichinho do hip-hop nunca me deixou… temos uma produtora [NoStress Records], onde produzimos para outros artistas; não produzíamos em nome próprio, mas produzíamos para outros artistas. E quer dizer... estas circunstâncias proporcionaram que eu e os outros elementos dos Black Comapany nos reuníssemos, depois surguiu a oportunidade de voltarmos a trabalhar juntos. Foi uma questão de vontade, de saudades uns dos outros e de fazermos musica juntos. Não é nada de muito complicado.

Mas não eram quatro?
Eramos… quer dizer, o grupo chegou a ter 30 elementos, depois foi reduzido a seis, e a quatro. De facto, quando obtivemos sucesso com o tema Nadar, éramos quatro. Tínhamos um DJ. Entretanto no álbum seguinte, já não era esse DJ… Mudamos de DJ, do DJ KGB para o DJ Soon. Neste álbum decidimos não incluir um DJ, mas os três MC’s continuam os mesmos.

Voltam para ficar, ou é um regresso de passagem?
Posso dizer, sinceramente, que a ideia é continuar a fazer música, agora em que termos… nunca se sabe, o futuro não se pode prever. Depende da forma como corram as coisas desta vez… mas a ideia é continuarmos juntos e conciliar o trabalho de grupo com os nossos projectos a solo. Será uma questão de conciliar a vontade e a disponibilidade de cada um. Em grupo é sempre mais complicado fazer as coisas, é preciso saber coordenar a vontade e o tempo de todos os elementos, enquanto que a solo só depende da vontade de um.

Então, mantêm-se os projectos a solo…
Sim, sim! Este ano já estou a preparar o meu novo álbum a solo...

E queres antecipar algumas informações acerca desse teu novo álbum.
Ainda está tudo nos segredos… (risos) em fase de composição e estúdio.

No que te inspiras para compor?
Ao contrário da generalidade, não gosto de ouvir a música dos outros quando estou a compor, para não me influenciar. Contudo, há situações inevitáveis, não estou isolado do resto do mundo... Mas quando chega à altura de compor, deixo de ouvir música, na tentativa de conseguir criar algo original e diferente. Inspiro-me em histórias da minha vida pessoal, em experiências… tento buscar inspiração na realidade, naquilo que acontece… normalmente falo de relações, tudo muito a ver com romance e com relações que acabam, que começam, que deviam de começar mas não começam…algumas coisas são baseadas na minha vida pessoal, outras na vida de pessoas conhecidas.

Abordaste a questão do aborto no teu álbum de 2005 (Chokolate), na música Estamos Sós, ainda a interrupção voluntária da gravidez era penalizada no nosso país. Que razões te levaram a explorar esse assunto?
Também já fui jovem e já passei por isso… e quis com essa música transmitir um bocado da luta pessoal e das decisões que às vezes se têm de tomar, e que são decisões difíceis, que vão influenciar o resto da nossa vida. Essencialmente, naquela música quis colocar-me no papel da mulher, a principal sofredora e vítima destas situações. E imaginar o que a vida poderia ter sido se não fosse tomada aquela decisão.

Já fez composições para uma série de artistas femininas – Gémeas, Nonstop, Diana Lucas, Just Girls. Como é escrever e trabalhar com mulheres?
É fixe (risos). É sempre diferente porque são só mulheres, mas já estou habituado e trabalha-se de uma forma muito fácil. Quer dizer, a experiência que tive com as artistas que referiste, foi sempre muito positiva. O caso mais difícil talvez tenha sido com a Diana, em que tive de escrever as letras de raiz de um álbum inteiro, o que me obrigou a encarnar no papel para que aquilo fizesse sentido.

Com quem te falta trabalhar?
Felizmente, quer em nome próprio, quer com os Black Company, já tive a oportunidade de trabalhar com muitos nomes. Do hip-hop já trabalhei com quase toda a gente; do R&B não há assim muita gente, mas dos novos valores não me importava de fazer qualquer coisa com o TT ou os Expensive Soul.

E vai acontecer?
Depende das músicas que eu tiver, porque eu escolho as pessoas com eu trabalho consoante aquilo que a musica precisa. Neste álbum faço intenções de ter alguns convidados, ainda não pensei em quem, mas eu tenho sempre muito gosto em fazer parcerias porque resultam sempre muito bem, e são uma mais valia para a música.

A Margem Sul está para Lisboa como Brooklyn para Nova Iorque?
(Pausa.) Agora nem tanto, mas já teve… Na Margem Sul foi onde nasceram, basicamente, os primeiros grandes nomes do hip-hop e também do rock. A margem Sul é sempre o ninho de muitos projectos e muitas coisas boas da música portuguesa. Sempre foi! E espero que continue a ser.

Diz-nos o que é importante para ti…
Importante para mim é: muita paz, muita saúde e o resto vem com trabalho e com esforço. É a gente fazer o que gosta, e as coisas podem demorar a acontecer mas quando fazemos aquilo que gostamos as coisas acabem sempre por acontecer.

1 comment:

Anonymous said...

Estou a adorar estas reportagens! Quando saí a próxima?? Bom trabalho*